GABRIEL HAESBAERT
Vitória e gratidão. Para Marquita Quevedo, 56 anos, essas duas palavras resumem as duas décadas de Parada Livre. Nome conhecido em Santa Maria e região por uma vida dedicada ao ativismo na causa LGBT+, a coordenadora da ONG Igualdade, afirma que o momento é de festa, mas também de muita luta. A ONG Igualdade foi criada em 2000 e foi a primeira organização da região central do Rio Grande do Sul criada com o propósito de combater todas as formas de preconceito, seja ele de cunho racial, sexual, social e de gênero.– É uma história construída não só por mim, mas por todo um coletivo. Nossa luta por espaços é constante e diária, considero uma conquista poder celebrar esses 20 anos.Marquita recorda momentos marcantes para gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais ao longo das duas décadas no mundo e no Brasil. Ela menciona o reconhecimento do casamento entre pessoas do mesmo gênero, a criminalização da homofobia e transfobia e, no âmbito local, fala da lei nº 5491/2011, que incluiu no calendário oficial do município de Santa Maria a Parada Livre da Região Centro. Isso tornou Santa Maria a primeira cidade da região a reconhecer o evento oficialmente. Conforme Marquita, esse fato foi essencial para a Parada poder contar significativamente com o apoio e a colaboração do Poder Público e demais entidades da sociedade civil.– Temos que celebrar as conquistas também. Muitas pessoas cresceram conosco nesses 20 anos. Elas contam que casaram, que se assumiram na parada, que vão com os familiares, então é muita honra e responsabilidade.
Com o tema “Meu voto, meu orgulho: por uma política que representa”, a edição comemorativa dos 20 anos da Parada Livre da Região Centro reforça ainda mais o objetivo do evento. Conforme Marquita, em ano eleitoral, é necessário que a população vote em políticos LGBT+ ou que apoiem as demandas da comunidade. Para ela, em um momento político de retrocesso e de perda de direitos, se faz cada vez mais necessária a presença de pessoas LGBT+ em todas as esferas, para discutir representatividade e espaços de poder na sociedade.– É necessário que existam atividades e eventos para a promoção de direitos humanos e cidadania da nossa população. Mas não é só no dia da parada, é todo dia. É a questão da educação, da empregabilidade para pessoas LGBT+ em Santa Maria e no país. A parada é um momento para festejar, amar, nos unirmos, mas também lembramos que é uma festa política.Com início às 16h, o evento contará com muitas atrações, shows e falas de ativistas e movimentos de todas as orientações sexuais e de identidades de gêneros. O padrinho do evento é o professor Flavi Lisboa Filho, pró-reitor de Extensão da UFSM.
Confira a programação da 20ª Parada Livre
Sábado, a partir das 14h
Palco livre com participação de Artistas LGBT+Roda de Conversa com o coletivo Ará Dudu, sobre o racismo na comunidade LGBT+Apresentação dos artistas MC Jan Pedro, recebendo convidados no palco, e Pablo KempzNos dois dias, o Ônibus Lilás, unidade móvel do Departamento de Políticas para as Mulheres da Secretaria Estadual de Desenvolvimento, Trabalho e Justiça (SCJDH/RS)estará oferecendo serviços gratuitos à população LGBT+, como orientação para retificação do nome e gênero, atendimentos de saúde e com psicólogos, advogados e assistentes sociais
Domingo, a partir das 14h
Concentração para a 2ª Caminhada Trans da Região Centro, na praça Saldanha MarinhoÀs 15 horas, na Gare da Estação, ocorre a Parada TransÀs 16 h, no mesmo local, inicia a 20º edição da Parada Livre da Região CentroShows de Raquel Tombesi, Ronald e Wesley, MC Jan Pedro, Onze Music, DJ Diego Silva, Conversa Fora, Arte Samba, DJ Mi Vargas, DJ Tilo, Studio de Artes Sensuais Femme on Fire, e muito mais
ÍCONES DA PARADA
Ao longo de duas décadas de história, diferentes personalidades marcaram presença nas edições da Parada Livre. Entre shows, apresentadores e participações de artistas, ativistas e público de diversas regiões do estado, destacamos algumas pessoas que abrilhantam a Parada.
São 20 anos de história, que a gente consegue perceber, através da ONG Igualdade, os avanços, a mudança de cultura e pensamento, mas também desafios. Podemos comparar até nas próprias mudanças da sigla, que começou com GLS, a sigla veio aumentando e isso é um sinal de visibilidade e resistência. É mostrar que a nossa população está viva, apesar de o Brasil ser o pais que mais mata e violenta a população “T “e isso é bem destacado na parada. Mas é importante mostrar também que essa população segue resistindo. Temos figuras emblemáticas. Acredito também que o tema da parada esse ano é muito importante, pois fala do voto que nos representa. Não basta ser negro, ser LGBT+, ser mulher, é preciso estar conectado com esses movimentos sociais populares, com as demandas e desafios. Os movimentos, conectados com as instituições e a imprensa, têm feito um trabalho essencial de levar informação. Onde há desinformação, há preconceito, ignorância, ódios e violências. Para a Parada esse ano, enquanto ativista, levaremos também a questão do racismo dentro da comunidade LGBT+.Gustavo Rocha “AfroGuga”, ativista e pesquisador
Através de manifestações como essa, nós podemos cobrar por políticas públicas e, principalmente, por respeito e igualdade. Eu hoje me encontro assessora parlamentar, mas eu gostaria que não só eu estivesse nesse patamar, mas que todas as trans tivessem condições de igualdade. Elas acabam na rua, estando vulneráveis à violência. Eu senti na pele essa falta de oportunidades. Eu fui a primeira trans a ser inserida no mercado de trabalho com carteira assinada e nome feminino. A Parada é o momento de manifestarmos nossos desejos por inclusão e também segurança, pois a comunidade LGBT+ é muito vulnerável à violência. Participei por muito tempo da Parada, foi um dos meus primeiros momentos de luta e organização. A partir dali, me tornei mais conhecida e empoderada.Cilene Rossi, assessora parlamentar
Para mim, além de ser uma honra estar como apresentadora há tantos anos, a festa também significa um ato de resistência, de ocuparmos espaços, reivindicar direitos e resistir contra toda e qualquer forma de intolerância e preconceitos. Tenho muito orgulho em poder fazer parte da ONG Igualdade durante todos esses anos sabendo que conquistamos respeito e reconhecimento na cidade e Região. Ser apresentadora é dar voz aos que se calaram pela LGBTfobia. Chegar até aqui é muito importante, mas por outro lado, é também saber que tem muito a se conquistar.Hellen Byanchini, empresária no ramo da beleza e apresentadora da 20º Parada Livre da Região Centro
Estamos felizes com a realização da 20ª Parada Livre da Região Centro, que neste ano tem como tema “Meu voto meu orgulho. Por uma política que representa”. Dialogando diretamente com o momento social e político em que vivemos, proporcionando a discussão sobre nossa representatividade nas esferas políticas, concomitantemente com a proposição de políticas públicas afirmativas efetivas para a nossa comunidade LGBT+. Assim, a parada vai cumprindo seu papel, de ser não apenas um momento de festa, visibilidade e empoderamento da nossa comunidade, mas, também, um símbolo de luta e resistência.Márcio Flores, do Museu de Arte de Santa Maria
É o quinto ano que apresento a parada de Santa Maria e é um enorme orgulho, pois sei que é uma das maiores paradas do estado. É muito mais que uma festa, é um ato público para demonstrar que existimos e que precisamos de políticas públicas, direitos sociais, e que somos humanos e estamos ocupando espaços. Estar em Santa Maria, para mim, é muito gratificante, é uma cidade que me recebe muito bem. Apresento eventos em São Paulo e não me sinto tão bem acolhido como em Santa Maria. Tenho certeza que depois de dois anos sem a parada, ela vai voltar em um dia lindo. Espero que as pessoas participem. Lembro-me da primeira vez que participei e o quanto me sinto participativo desse crescimento da parada. Moro em Porto Alegre, mas vou a Santa Maria para participar sempre com muita alegria.Vagner de Oliveira, advogado especialista em direito homoafetivo e apresentador da 20º Parada Livre da Região Centro
Lá em 2002, fui uma das drag queens da corte do Carnaval da Escola de Samba Vila Brasil e, em seguida, já comecei a me apresentar e a trabalhar com a ONG Igualdade. Participei de quase todas as edições da Parada, sempre no apoio e na organização, falando no palco. Me marcou muito algumas leis que tivemos em prol da nossa comunidade no Brasil ao longo desses 20 anos de parada. Parabenizo a Marquita, a ONG Igualdade e toda a comunidade LGBT+ de Santa Maria pelos 20 anos de Parada.Rodrigo Bordim, técnico em segurança do trabalho
A minha história com a Parada vem desde o início. Eu e meus amigos tínhamos vontade de manifestar toda a nossa irreverência contra o sistema. Estávamos carentes porque já não existia mais um espaço para a comunidade LGBT+, como a Maré Vermelha (torcida organizada do Inter-SM que acabou no início dos anos 90), em que todos participavam. A parada nos fortalece. Essa cidade sempre nos excluiu, então, este evento se consolida como uma trajetória de luta, força e desejo de que nossa comunidade não seja mais invisibilizada.Luis Carlos Kunrath, professor da rede pública
A importância do evento para a Cidade Cultura
Conquistas ao longo desses 20 anos, como a inclusão da Parada Livre no calendário oficial do município, em 2011, e a adesão de Santa Maria ao Pacto Municipal de Enfrentamento à Violência LGBTfóbica, neste ano, mostram que é essencial o engajamento de órgãos públicos e autoridades e personalidades à causa. Convidamos representatividades de diferentes áreas para falar da importância da Parada Livre para a comunidade LGBT+ e para Santa Maria.
O principal foco direcionado ao público LGBT+ é o respeito. Somos a primeira cidade do Estado a aderir ao Pacto Municipal de Enfrentamento à Violência LGBTfóbica, previsto pelo Estado. É gratificante e me orgulho em saber que o pacto é um comprometimento a mais na continuidade de políticas públicas que a prefeitura desenvolve. Trata-se de uma formalidade de iniciativas integradas que nossas secretarias já desenvolvem, como o Ambulatório Transcender, que logo terá novo endereço para melhor atender as pessoas.Jorge Pozzobom, prefeito de Santa Maria
Uma sociedade moderna está baseada no respeito às individualidades. Ter um evento como esse na Gare, que faz parte do nosso Distrito Criativo, contribui diretamente para aquilo que queremos para o Centro Histórico: um espaço de criatividade e diversidade cultural. Santa Maria tem, justamente, a característica de ser cosmopolita, ou seja, de incluir, em um mesmo ambiente, as mais variadas formas de expressão. Essa característica precisa ser ressaltada e fomentada.Rodrigo Décimo, vice-prefeito de Santa Maria
Esses movimentos são de extrema importância, pois objetivam uma sociedade mais tolerante e mais respeitosa. Compreender que nenhuma cultura é melhor ou pior que a outra . É apenas diferente. E essa diferença tem que ser respeitada, de maneira que todos possam aprender a lidar com a diversidade, respeitando e procurando conviver com essa diferença.Rose Carneiro, secretária de Cultura de Santa Maria
A Parada Livre é um momento impar em nossas existências. Um dia especial em que celebramos a nossa vida e a nossa forma de viver, e de mostrar ao mundo um pouco do que produzimos nas artes, na cultura e no social. É muito bom poder celebrar 20 anos de resistência e existência, e saber que esse evento gerou bons frutos como a luta contra o preconceito, a criminalização da homofobia, o direito ao casamento civil, entre outros. Foi participando das Paradas que ganhei visibilidade, reconhecimento e a aproximação de algumas vozes desse imenso arco-íris. Acreditei que eu poderia ser o amplificador e dar potência a essas vozes. Sou realizado em fazer parte desses 20 anos de parada. Rudys Rodrigues, vereador
É um importante ato para chamar a atenção das pessoas em defesa da igualdade, respeito, inclusão, e, sobretudo, do combate ao preconceito, à homofobia e à discriminação. Precisamos que nossas vozes sejam ouvidas pela sociedade e que nos respeitem como seres humanos que somos com nossos direitos já conquistados. São 20 anos de uma ação em busca de compreensão, visibilidade às nossas causas. Precisamos valorizar esses momentos em defesa das causas LGBT+.Luci Duartes, vereadora
Foi com muita alegria que recebi o convite da ONG Igualdade para ser Padrinho da Parada Livre. A ONG cumpre um trabalho importantíssimo, especialmente na luta pela existência de políticas públicas que possam ser voltadas para a população LGBT+. E a Parada Livre é um momento de celebrar as diferenças que nós temos porque os grupos sociais minoritários são muito marginalizados, silenciados e invisibilizados. Um evento que serve para celebrar as diferenças ajuda a trabalhar positivamente a representação das identidades de pessoas que fazem parte da comunidade LGBT+. Então, é um motivo de grande alegria e orgulho poder celebrar as nossas diferenças nesse evento.Flavi Lisboa Filho, Pró-Reitor de Extensão da UFSM
A Parada Livre é um evento de extrema importância, nesse momento ainda, por ser a primeira depois da pandemia, por ser os 20 anos. Ela dá visibilidade à comunidade LGBT+, permite também que a sociedade em geral conheça a luta pelos seus direitos fundamentais. Sem contar que é um evento alegre e feliz que agrega cultura. É um momento importante para toda a comunidade de Santa Maria se somar. É um encontro que dá grande visibilidade à comunidade LGBT+ e a sua luta por direitos fundamentais, que é o principal. Débora Dias, delegada da Delegacia de Proteção ao Idoso e Combate à Intolerância
A importância de eventos como a parada LGBT é tornar visível uma população que constitui sua identidade a partir das diferenças sexuais e de gênero. É necessário eventos assim para que se apresentem como sujeitos de direitos (como qualquer pessoa é assegurada) e que lutam diariamente pela vida, padecem de sofrimento, alimentam-se de esperança, e principalmente, amam de diferentes formas. E aí está também o sentido político das paradas, a afirmação que as pessoas LGBT existem, e que são milhares. Renata Quartiero, Vice-Presidente da Comissão de Diversidade e Gênero da OAB-Santa Maria
Leia todas as notícias